Há seis horas prisioneiro da parte dos fundos da
agência do Banco do Brasil da rua São Francisco, no centro da cidade, Raimundo
Macedo (PMDB), 70 anos, prefeito pela segunda vez de Juazeiro do Norte, Ceará,
recebeu por volta das 22h a notícia que aumentaria de vez seu desespero: do
lado de fora, ocupando todos os espaços disponíveis, tendia a crescer a
multidão estimada em quatro mil pessoas disposta a passar a noite em vigília
para impedi-lo de sair dali.
Quem mandou Raimundo, de apelido
Raimundão, não conseguir refrear sua curiosidade?
No meio da tarde, ao saber que uma passeata contra ele
percorria as principais ruas da cidade, Raimundo decidiu observá-la de longe.
Meteu-se no carro oficial, chamou um primo para acompanhá-lo e saiu atrás da
passeata. Foi seu grave erro. O alerta foi dado pelo primeiro manifestante que
reconheceu o carro à distância: "Pessoal, olha o carro do Raimundão".
A multidão cercou o carro. Há muito custo, o motorista manobrou e conseguiu
chegar à agência do Banco do Brasil. Raimundo e o primo desembarcaram às
pressas.
Ex-deputado federal, Raimundo faz uma
administração considerada desastrosa até por correligionários dele que preferem
não ser identificados. Os professores se tornaram suas principais vítimas.
Simplesmente, Raimundo reduziu o salário deles em 40% e aumentou em 200 horas
sua carga mensal de trabalho. O prefeito, parentes e aliados deles são
personagens de histórias escandalosas que divertem a oposição e irritam quem
não gosta de política e de políticos por considerá-los, indistintamente,
ladrões.
Um aperitivo: Mauro Macedo, filho do prefeito e Secretário de Governo, é casado
com uma mulher dona de uma loja de roupas femininas conhecida como "A
Daslu do Cariri". Juazeiro é uma cidade cheia de buracos. Pois bem: a rua
da loja da mulher de Mauro foi toda asfaltada - bem como pequenas ruas que
desembocam nela. Adversários de Raimundo dizem dispor de provas de que ele e
alguns secretários desviam dinheiro público e promovem licitações viciadas
vencidas por empresas de amigos.
Cerca de 100 PMs tentaram no fim da
tarde resgatar o prefeito na agência bancária. Valeram-se para isso de um
carro-forte. Mal o carro estacionou nas vizinhanças da agência, os
manifestantes começaram a apedrejá-lo. Tentaram furar seus os pneus. E para
evitar que ele servisse à fuga do prefeito, os manifestantes deitaram no chão
na frente do carro, pelos lados, por detrás e debaixo dele. Repetiram a manobra
por volta das 21h quando chegou à agência uma Hilux da PM.
Às 23h12h, além da
multidão, a rua São Francisco abrigava tendas e barracas onde parte dos
manifestantes planejava atravessar a madrugada. Dentro da agência, Raimundo, o
primo e o motorista aguardavam a visita de Mariane Gurgel, Procuradora Geral do
Município. O plano de Raimundo era convencer Mariane a negociar sua liberdade
com os manifestantes a tempo de ele comparecer ao Parque da Cidade para a única
apresentação da banda Aviões do Forró, contratada pela prefeitura por R$
250 mil.
Não foi preciso a intermediação de Mariane. Por volta das 23h30, o contingente
de 100 PMs, usando e abusando de cassetetes, sprays com gás de pimenta e até
escopeta, cercou o prefeito e conseguiu empurrá-lo para dentro de uma camionete
policial que havia sido providenciada. Os manifestantes que tentaram impedir a
saída do prefeito ficaram duramente machucados. Um soldado confidenciou que o
prefeito prometeu gratifica-los com R$ 50 mil do próprio bolso. Ninguém sabe ao
certo. (Blog do Noblat)