Sete meses após assumir o cargo, o presidente da Câmara ainda enfrenta o fantasma de seu antecessor e padrinho, Arthur Lira, e tem sua autoridade colocada em xeque apesar de sempre defender o diálogo com os líderes.
A cena foi simbólica. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), sem participar do acordo que haviam feito por ele, tentava em vão chegar à sua cadeira de comando. Deu meia volta e já ia se retirando quando um deputado o convenceu a voltar. Não fosse isso, muito provavelmente o motim de deputados bolsonaristas que travou o funcionamento do plenário, em uma das cenas mais emblemáticas da história recente do Congresso, teria durado ainda mais.
Era a primeira semana de agosto. Motta já havia passado o primeiro semestre inteiro se equilibrando para agradar o amplo leque de partidos que o apoiaram na eleição, do PL ao PT. Desde o episódio inusitado que marcou o fim do motim, três semanas se passaram e, nos últimos dias, o mesmo sentimento de impotência rondou novamente o poder institucional do presidente da Câmara.
Para pagar a fatura do acordo que liberou finalmente o plenário, Hugo Motta tentou agradar a oposição, que até agora vem escapando ilesa de qualquer punição pela obstrução. Motta escolheu relator e levou para a pauta a proposta de emenda constitucional que pretendia dar superpoderes aos congressistas e blindá-los de quaisquer investigações não autorizadas pelo próprio Congresso.
Na reunião de líderes da semana, um texto sobre o tema encomendado pelo próprio Motta, de autoria do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), precisou competir com outro, levado pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), que comandava a Câmara até o início deste ano e, do alto de sua posição de chefe do Centrão, circula pela casa como uma eminência parda.
Como era de se esperar, em razão da reação da opinião pública à ideia de blindar as excelências, ninguém topou assinar a proposta. No dia seguinte, até mesmo o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), que até então vinha defendendo a medida, acabou desistindo de levar a PEC adiante.
No fim das contas, Motta seguiu devendo, porque ainda não foi desta vez que pagou o acordo com a oposição.
Na mira do STF, a destinação dos recursos significa mais um problema a ser administrado, pois regula a disposição de deputados para a aprovação de matérias, sejam elas quais forem. Sem o dinheiro das emendas para distribuir livremente, como acontecia antes, o poder do presidente da Câmara diminuiu naturalmente.
Responsável pela definição da pauta, Motta tenta imprimir a marca do valorização dos líderes na definição do que vai ser votado. Lira chegou a defender o mesmo tipo de diálogo ao tomar posse no comando da casa, mas na prática sempre foi dele a palavra final. Era quem decidia de fato. Motta, em sentido contrário, não consegue exercer a prerrogativa de decidir.
Motta também enfrenta uma investigação do TCU (Tribunal de Contas da União) por ter empregado em seu gabinete três funcionárias fantasmas, uma delas investigada pela prática de “rachadinha” entre os anos de 2005 e 2009, época em que trabalhava no gabinete do deputado Wilson Santiago, do mesmo partido (Republicanos) e do mesmo estado (Paraíba) do atual presidente da Câmara.
Nos próximos dias, Motta voltará à Câmara em meio a duas pressões. Por parte do governo, a insistência é pela votação do projeto que prevê isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil e taxação dos mais ricos. Por parte da oposição, a pressão é pela “pauta do motim”, que inclui a PEC da Blindagem, a PEC do Foro Privilegiado e a anistia.
Mais uma vez, ele terá a oportunidade de decidir. A ver se o fará.
(PlatoBR)