terça-feira, 7 de junho de 2022

FEDERAÇÕES ENFRENTAM DISSIDÊNCIAS E CRIAM “CASAMENTOS DE FACHADA” NOS ESTADOS

 


(JOÃO PEDRO PITOMBO ) - A criação de federações partidárias, que passarão a valer a partir das eleições deste ano, uniu adversários locais no mesmo campo político, começa a enfrentar dissidências e pode resultar em uma espécie de "casamento de fachada" em parte dos estados.

O prazo para o registro de federações partidárias se encerrou na última segunda-feira (30) com a criação de três federações. No campo da esquerda PT, PC do B e PV estarão amarrados pelos próximos quatro anos, assim como o PSOL e a Rede. Na centro-direita, se uniram o PSDB e Cidadania.

Nas federações partidárias, as legendas que se associam são obrigadas a atuar de forma unitária ao menos nos quatro anos seguintes às eleições, nos níveis federal, estadual e municipal, sob pena de sofrerem punições. É um modelo diferente das coligações, que foram vetadas em eleições proporcionais.

O novo mecanismo deve ajudar os partidos a superar a cláusula de barreira, que estabelece percentual mínimo de votos e de deputados eleitos para manter o acesso à propaganda partidária e ao fundo eleitoral.

Batizada com o nome "Brasil da Esperança", a federação entre PT, PC do B e PV enfrenta imbróglios na montagem de palanques estaduais em Pernambuco, Tocantins, Mato Grosso, Maranhão e Distrito Federal.

Os principais focos de atrito se dão entre PT e PV, partido que na última legislatura se alinhou a partidos de centro-direita em estados como a Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo.

A adesão à federação e o apoio à pré-candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022 fez com que parte dos filiados deixasse o partido. Mas ainda há uma parcela que permaneceu no PV e ainda assim flerta com candidatos de outros partidos nos estados.

"Há um esforço muito grande para que não haja ruído na nossa caminhada até a eleição. A gente torce para que os presidentes dos partidos nos estados tentem negociar, a gente só vai intervir onde tiver problema", afirma o presidente nacional do PV, José Luiz Penna.

Em São Paulo, por exemplo, ao menos 12 prefeitos do PV anunciaram apoio à reeleição do governador Rodrigo Garcia (PSDB) em detrimento da pré-candidatura do ex-prefeito Fernando Haddad (PT).

O comando do partido alega que são prefeitos ligados a deputados que deixaram a legenda na janela partidária e que tendem a não permanecer nas próximas eleições municipais.

O Tocantins é outro estado com potencial de conflito. O PV local, liderado pela família Lélis, é próximo ao governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) e deve apoiar, mesmo que informalmente, a sua reeleição. O PT, por sua vez, lançou ao governo o ex-deputado Paulo Mourão.

O cenário é parecido em Mato Grosso, onde o vice-prefeito de Cuiabá José Roberto Stopa (PV) desistiu de concorrer ao governo após o PT decidir ter candidato próprio ao cargo. Stopa saiu de cena atirando.

"Eu já estava de saco cheio. Nós fizemos um acordo com a federação, que poderia aparecer dez nomes, vinte nomes e o melhor nome seria escolhido candidato. O que não pode é companheiro criticar companheiro, ficar com essa mesquinharia", disse em entrevista à imprensa.

O imbróglio agora se voltou para a vaga para o Senado: o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (MDB), trabalha para emplacar sua mulher Márcia Pinheiro (PV), mas esbarra no PT, que lançou a professora Enelinda Scalla.

No Distrito Federal, PT, PV e PC do B têm candidatos próprios ao governo e terão que chegar a um denominador comum. O Palácio do Buriti é uma das prioridades do PV, que lançou o deputado distrital Leandro Grass para o cargo.

Já no Maranhão, a federação uniu sob o mesmo guarda-chuva adversários históricos no estado: o PC do B, que já abrigou o ex-governador Flávio Dino (PSB), estará unido ao PV, partido ligado à família Sarney que fez oposição ferrenha ao então governador.

"Não tenho restrição a Flávio Dino, mas é preciso diálogo. Estamos vivendo um novo momento no Maranhão sem aquela dicotomia entre Sarneys e anti-Sarneys. É um projeto uma nova geração", diz o deputado estadual Adriano Sarney (PV).

A união, contudo, enfrenta conflitos. O PV critica a influência do PSB nos rumos da federação com a pressão pela escolha do nome do ex-secretário Felipe Camarão (PT) como candidato a vice do governador Carlos Brandão (PSB).

Em Pernambuco, a disputa é entre PT e PC do B e se dá em torno do Senado. A vice-governadora Luciana Santos (PC do B) pleiteia concorrer na chapa de Danilo Cabral (PSB), mas o PT indicou a deputada estadual Teresa Leitão. Procurada, Luciana Santos disse que a situação está em debate interno.

A federação entre PSDB e Cidadania também enfrenta divergências no campo nacional. Enquanto os tucanos ainda não definiram se terão candidatura própria ao Planalto, o Cidadania já definiu o seu apoio à pré-candidatura de Simone Tebet (MDB).

Nos estados, a decisão de unir os partidos também gerou baixas. A principal delas foi a desfiliação do governador da Paraíba João Azevêdo, que trocou o Cidadania pelo PSB e vai disputar contra o PSDB, que concorre com o deputado Pedro Cunha Lima.

Com a aprovação da federação pelo Tribunal Superior Eleitoral, os estados do Amazonas e do Distrito Federal passaram a ser centro da discórdia entre os partidos. O Cidadania apoiará candidatos tucanos em dez estados, mas esperam reciprocidade.

No Amazonas, o Cidadania passou a abrigar o ex-governador Amazonino Mendes, que lidera as pesquisas de intenção de voto para o governo. Entre os tucanos, contudo, o senador Plínio Valério também se movimenta para concorrer ao governo.

O caso do Distrito Federal é semelhante: o senador Izalci Lucas (PSDB) é pré-candidato a governador. Mas a deputada federal Paula Belmonte (Cidadania) negocia disputar o Senado em outra chapa, que seria liderada pelo senador Reguffe (União Brasil).

Nos dois casos, a disputa entre os pré-candidatos tem sido marcada por rusgas e com poucas chances de um denominador comum sem intervenção dos diretórios nacionais dos partidos.

O PSDB indicou que deve ceder no Amazonas: o presidente nacional do partido, Bruno Araújo, enviou uma carta a Plínio Valério afirmando que o partido não terá candidato próprio no estado. O senador disse que não acompanhará o partido nas eleições local e nacional.

"Vejo o Amazonino como retrocesso. E, nacionalmente, o PSDB ser coadjuvante do MDB, é coisa de quem não compreende o verdadeiro tamanho do PSDB", afirmou o senador.

Os tucanos, contudo, não abrem mão da candidatura no Distrito Federal. Mas a deputada Paula Belmonte indica outro caminho e afirma que pode concorrer ao governo caso Reguffe decida disputar o Senado.

Também há rusgas na federação firmada entre o PSOL e a Rede Sustentabilidade, começando pela eleição nacional. Enquanto o PSOL vai unificado no apoio a Lula, a Rede liberou seus filiados a apoiar o petista ou Ciro Gomes (PDT).

Em Minas Gerais e Espírito Santo, a parceria entre os dois partidos ficará apenas no papel, em uma espécie de "casamento de fechada".

O PSOL de Minas lançou ao governo a professora Lorene Figueiredo, mas a Rede deve dar apoio informal à candidatura de Alexandre Kalil (PSD), ex-prefeito de Belo Horizonte.

No Espírito Santo, o cenário é o contrário: a Rede vai lançar para o governo o ex-prefeito de Serra, Audifax Barcelos. O PSOL, contudo, não vê a parceria com bons olhos, já que o pré-candidato da Rede negocia o apoio de legendas da centro-direita.

Porta-voz da Rede, a ex-senadora Heloísa Helena diz que os dois casos estão devidamente respaldados pelo Estatuto da Federação e pela Resolução Política pactuada na estruturação da parceria.