O
deputado federal Pedro Cunha Lima (PSDB) é filho do ex-governador da Paraíba
Cássio Cunha Lima e neto do também ex-governador Ronaldo Cunha Lima. Neste ano,
ele vai tentar levar a terceira geração da família ao governo do estado.
Ele
não é o único: ao menos 18 filhos, netos e sobrinhos de políticos tradicionais
vão concorrer a governador. Destes, 15 estreiam em disputas estaduais
majoritárias, marcando a ascensão de uma nova geração de clãs familiares da
política brasileira.
O
fenômeno tem mais força em estados do Nordeste, onde filhos de políticos
concorrem a governos em sete estados. Mas também há candidaturas também no
Acre, Pará e Rio Grande do Sul.
Caso
tenham sucesso nas urnas, devem protagonizar uma volta por cima de clãs
familiares que estiveram em baixa na eleição de 2018, marcada pelo ocaso de
famílias como os Sarney e os Lobão, no Maranhão, os Maia e os Alves, no Rio
Grande do Norte, e os Jucá em Roraima.
Na
eleição de 2022, devem caminhar sobre uma linha que separa a memória de
realizações de seus antepassados, o desafio de mostrar que têm luz própria e as
acusações de adversários de representarem uma tradição clientelista.
"O
clientelismo brasileiro é alicerçado em tradições familiares e famílias
políticas poderosas. Isso se exacerba com movimentos que podemos chamar, a
grosso modo, de patronato político brasileiro", afirma o cientista
político Elton Gomes, doutor pela Universidade Federal de Pernambuco.
A
eleição em Pernambuco será a mais marcada pela influência dos clãs familiares:
os cinco principais pré-candidatos ao governo são filhos ou netos de líderes
políticos.
Neta
do ex-governador Miguel Arraes (1916-2005), Marília Arraes (Solidariedade) tem
reforçado a ligação com o avô, enfatizando o sobrenome e marcas da gestão
Arraes, como o chapéu de palha.
Em
sabatina à Folha e ao UOL, ela disse que ninguém pode ser penalizado pelo
sobrenome que tem. "Tenho muito orgulho não só de ser neta como ter
aprendido com Miguel Arraes."
Pré-candidata
do PSDB a governadora, Raquel Lyra é filha do ex-governador João Lyra Neto e
possui um sobrenome tradicional na política de Caruaru, a maior cidade do
interior.
O
bolsonarista Anderson Ferreira tem pai, irmão e cunhado na política. Manoel,
André e Fred Ferreira são respectivamente deputado estadual, federal e vereador
do Recife. Ainda assim, Anderson diz ser diferente dos adversários.
"Meu
pai entrou na política pelo segmento evangélico. Antes de ingressar na vida
pública, eu fiz um trabalho evangelístico. Eu não tinha apoio de vários
prefeitos, mas tinha ligação com as pessoas", disse Anderson em sabatina
Folha/UOL.
Além
de ser filiado ao PSB, partido sob forte influência da família Campos, Danilo
Cabral é também filho do ex-deputado estadual Adalberto Cabral. Já Miguel
Coelho (União Brasil) faz parte de um clã que já esteve no poder na prefeitura
de Petrolina mais de 13 vezes, entre mandatos consecutivos e alternados.
O
cenário é semelhante em Alagoas, onde os quatro principais pré-candidatos ao
governo vêm de famílias políticas.
Rui
Palmeira (PSD) é filho do ex-governador Guilherme Palmeira (1838-2020) e neto
do ex-senador Rui Palmeira (1910-1968). Ex-prefeito de Maceió, ele diz que o
legado de seu pai tem ajudado na caminhada na disputa pelo governo.
"Há
uma lembrança muito positiva, um carinho dos eleitores. Isso também cria uma
responsabilidade e uma cobrança porque as pessoas sempre vão comparar",
afirma o ex-prefeito de Maceió.
Ancorado
por uma ampla aliança na disputa pelo governador alagoano, o senador Rodrigo
Cunha (União Brasil), também vem de uma família de políticos. Mas a política
entrou na sua vida após uma tragédia familiar.
Ele
tinha apenas 17 anos quando teve a mãe e o pai assassinados em 1998. Sua mãe,
Ceci Cunha (PSDB), foi morta em 1998 no dia de sua diplomação como deputada
federal.
O
suposto mandante do crime, que vitimou seu pai e outros dois parentes, foi o
próprio suplente de Ceci, o então deputado federal Talvane Albuquerque.
Sem
a presença dos pais, teve que construir sozinho a sua trajetória na política,
que começou com a eleição para deputado estadual em 2014. Com ascensão
meteórica, chegou ao Senado quatro anos depois.
Os
outros dois pré-candidatos mais competitivos no estado também são filhos de
políticos. O governador e candidato à reeleição Paulo Dantas (MDB) e Fernando
Collor de Mello (PTB), ambos filhos de políticos.
Na
Bahia, a ascendência familiar do ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União
Brasil) tornou-se um dos centros do debate eleitoral.
Ele
iniciou a pré-campanha rememorando o jingle o histórico do avô Antônio Carlos
Magalhães (1927-2007), que foi governador da Bahia por três mandatos, dois
deles por eleição indireta.
Em
entrevista à rádio Portal do Oeste FM, o governador Rui Costa (PT) chamou ACM
Neto de "filhinho de papai" que "nasceu em berço de ouro".
O ex-prefeito disse que o petista agiu de forma preconceituosa.
Também
vem de família tradicional o pré-candidato a governador e deputado federal João
Roma Neto (PL). Radicado há cerca de 20 anos na Bahia, ele é neto de João Roma
(1912-1991), deputado federal por Pernambuco de 1966 a 1971.
Na
Paraíba, o pré-candidato tucano Pedro Cunha Lima também faz parte da terceira geração
de políticos da família. Ele afirma que as trajetórias do pai e do avô o
inspiram, mas que não pretende ficar preso ao passado.
"Tenho
orgulho do meu sobrenome, mas não sou apenas um nome. Sou alguém que carrega
uma bagagem, uma visão de mundo e busco estar sintonizado com a minha geração.
Os tempos são outros e os desafios são novos", afirma Cunha Lima.
Ele
disse que os sobrenomes têm menos influência nas eleições, mas ainda têm seu
peso: "É claro que traz uma força política, não posso negar isso. A
intenção de voto que tenho não vem só da minha história, existe um
reconhecimento do trabalho dos que vieram antes de mim".
Na
disputa pelo governo, ele terá como adversário outro membro de família
tradicional: o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB), neto do ex-governador
Pedro Gondim, além de irmão de ex-senador e filho de senadora.
Partido
que historicamente teve menor abertura para clãs familiares, o PT terá dois
filhos de ex-deputados concorrendo a governos estaduais neste ano.
O
pré-candidato a governador do Piauí é o empresário Rafael Fonteles,
ex-secretário da gestão Wellington Dias (PT) e filho do ex-deputado federal
Nazareno Fonteles.
No
Rio Grande do Sul, o pré-candidato petista ao governo, Edegar Pretto, é filho
de Adão Pretto, deputado estadual por seis mandatos. O petista, no entanto,
entrou na política somente após a morte do pai em 2009, vítima de uma
pancreatite.
Fora
do Nordeste, dois governadores que descendem de outros ex-governadores de seus
estados concorrem à reeleição: Helder Barbalho (MDB) e Gladson Cameli (PP).
Derson
Maia, cientista político pela UnB, destaca que o sistema político tende a
manter o seu formato, mas que pode sofrer fissuras a partir da eleição de
pessoas de fora das famílias tradicionais.
"Quando
pessoas oriundas de outra classe econômica, aspecto social ou racial são
eleitas, isso gera fissuras, ainda que pequenas, no sistema e faz com que a
ordem de prioridades na agenda pública mude", diz.