Ex-governador, ex-ministro e
ex-deputado federal, o candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes, acredita
que, na terceira tentativa de ocupar o cargo máximo da República, sua hora
chegou. “A estrada é tortuosa e complexa, mas acredito que eu sou o candidato
favorito”.
Confiante, ele já tem vários projetos
para a economia. Em entrevista ao JORNAL DO BRASIL, fala sobre suas propostas
em relação à geração de empregos, à reforma da Previdência, à legislação trabalhista
e à concentração do sistema bancário. Também dá detalhes sobre sua polêmica
promessa de limpar o nome das pessoas no SPC. “Já existe o Refis para os
empresários, vou lançar o Refis dos pobres, para refinanciar a dívida das
famílias”, afirma o pedetista.“ O PT está convidando a nação a bailar na beira
do abismo”
O senhor procurou vários contatos para fazer alianças, e acabou que elas
não vingaram. Isso prejudica a sua campanha?
Quando me coloquei candidato, já sabia
que a probabilidade de estar na luta era da forma como eu estou. No entanto, o
quadro partidário brasileiro cansou e preciso também olhar isso com atenção.
Uma pessoa como eu, que sabe como a coisa de verdade é, sabe que o partido que
mais vai eleger deputados não vai fazer mais que 10% da Câmara, isso, então, me
obriga a ter um bom diálogo com todas as forças. Jamais esteve na minha ideia
de que o tal “centrão” pudesse vir para mim, eles são oposição a tudo que eu
penso. Eles me convidaram para conversar e foi muito útil. Inclusive, saí dali
com alianças em estados muito importantes. Mas, evidentemente, eles acabaram
decidindo ficar onde era mais confortável e mais coerente para eles, que era na
situação com o (candidato do PSDB, Geraldo) Alckmin, e junto da base de
sustentação do (presidente Michel) Temer. O PSB, é bom lembrar, teve candidato
à Presidência, o Joaquim Barbosa. Eu não podia contar com eles. Entretanto,
passou a candidatura do Joaquim, e eles me procuraram. Dali também ficaram
alianças muito importantes em vários estados. Mas depois, pela pressão do PT,
eles acabaram ficando neutros. Tive um revés, porque podia ter alguns segundos
a mais no tempo convencional de TV, mas nada me prejudicou.
O fato de ser uma chapa pura do PDT não significa um prejuízo?
Não. O jornalismo brasileiro precisa
entender um pouco o que está acontecendo com a opinião pública. É
impressionante como a imprensa de São Paulo quer resolver eleição dentro de
gabinete dos jornais. Segundo o jornal, o primeiro lugar nas pesquisas, que é o
(candidato do PSL, Jair) Bolsonaro, está isolado, é um partido pequeno com
chapa pura. Em segundo lugar, sou eu na mesma situação. Em terceiro, é a Marina
(Silva, candidata da Rede), ou vice versa. Então, você só vai encontrar
estruturas iguais.
O PT conseguiu, em um último momento, o apoio do PSB e do já tradicional
PCdoB.
O PT só conseguiu candidatura,
praticamente, em Pernambuco, apenas pela mentalidade do PSB, que é
completamente exótica. O PT tem, exclusivamente, o velho puxador dele, que é o
PCdoB.
Muitos esperavam uma união da esquerda no 1º turno, que não acontecer.
Isso pode prejudicar uma eventual aliança no 2º turno?
É muito provável que no 2º turno nos
encontremos. O pior de tudo é o jeito com que a burocracia do PT está
conduzindo o processo. Na verdade, a confusão é grande na cabeça do povo. Eles
dizem que o (ex-presidente Luiz Inácio) Lula é candidato, registram o Lula
candidato, como se fosse esse o correto, quando todas as pedras no caminho
afirmam que ele não é candidato. O problema é que, na prática, o PT está
convidando a nação a bailar na beira do abismo.
O senhor acredita que o Tribunal Superior Eleitoral vai decidir pela
inelegibilidade?
Se o senso comum e 100% dos
profissionais de direito que eu conheço foram corretos, todo mundo afirma que a
Lei da Ficha Limpa é clara. Perde o direito de ser candidato a pessoa que tiver
sido condenada por crime de corrupção em 2ª instância.
Qual é o quadro que o senhor vê sem ele? Alguma coisa vai mudar?
Não, acho que o cenário é esse. Haverá,
no começo de campanha, o Bolsonaro caindo discretamente, o Alckmin subindo
discretamente, a Marina caindo discretamente, eu subindo discretamente e o
candidato do PT, depois que o Lula sair, descendo também.
Então, pode-se afirmar que haverá um candidato de esquerda no 2º turno? O
senhor acredita nisso?
A forma como o PT está manipulando esse
assunto abre uma possibilidade de ser o Alckmin contra o Bolsonaro, ou do
Bolsonaro contra a Marina.
Por que o senhor afirma isso?
Com o impasse na cabeça do povo mais
simples, que é quem gosta do Lula, que tem gratidão pelo Lula, e está sendo,
basicamente, enganado. O Lula é candidato sem ser. Ninguém sabe o que vai ser.
Eles podem não votar necessariamente em uma pessoa de esquerda.
Quando a gente simula isso, espalha
tudo. Vai voto para o Bolsonaro, por exemplo.
O senhor acredita que tem chances de ir para o 2º turno e ser eleito?
A estrada é tortuosa e complexa, mas
sou o candidato favorito. O povo brasileiro, em sua esmagadora maioria, quer
uma mudança que não seja um radical, baseada em projetos, em experiência, em
ficha limpa. Esse conjunto de atributos eu tenho.
O senhor disse que pode gerar 2 milhões de emprego no primeiro ano. Como
isso seria concretizado?
O Brasil tem 7300 obras públicas
paradas, ou seja, licenciadas, com projeto, avançadas em execução, e paradas
por um conjunto de coisas que não exige propriamente dinheiro. Tem condição de
reestruturar rapidamente isso. A única forma de gerar emprego a curto prazo no
Brasil é construção civil.
O senhor falou que é preciso mudar a excessiva concentração do sistema
bancário no Brasil. O que se pode fazer para isso?
Têm providências práticas de curto
prazo são obrigar o Banco do Brasil e a Caixa Econômica a competir. Hoje elas
fazem parte do cartel. E depois usar a estimulação tributária, e uma série de
coisas, entre elas, a fintech – uma espécie de ‘bancarização’ digital – que são
dois exemplos que vão começar no primeiro dia do meu governo. A médio prazo só
uma profunda reforma fiscal, que permita virar o foco do déficit, que vai
descomprimir a grande demanda por crédito que o governo impõe ao mercado,
garantindo que os bancos não precisem emprestar para ninguém, porque vão ter
grandes tomadores que não fecham, não quebram e, tradicionalmente, não cobram
taxas de juros absolutamente imorais.
Outro ponto seria a reforma da Previdência. Quais seriam os pontos que
poderiam ser atacados?
Estou propondo um projeto nacional de
desenvolvimento. Esse sistema previdenciário brasileiro não dá para reformar, O
Brasil é um dos três países da América Latina que ainda pratica o regime de
repartição. Os dois outros são Argentina e Venezuela, e não são boas companhias
pois estão absolutamente quebrados por causa disso. É preciso colocar em debate
um modelo novo de capitalização. A diferença básica é que na repartição, a
atual geração paga a aposentadoria de quem passou no mercado de trabalho. No
sistema que proponho, cada geração poupa para si mesma. Parte é compulsória e
parte é voluntária. O setor público e o setor privado caminhariam para uma
coisa só. Teto para os dois.
O senhor diz que vai rever a reforma trabalhista feita pelo governo
Temer. Qual seria o desenho da reforma que o senhor quer propor?
A gente precisa corrigir três vícios de
origem dessa reforma que o Temer fez. O primeiro, a ilegitimidade. Não se pode
fazer coisas dessa repercussão sem chamar as pessoas para conversar. Não se
pode fazer o desmonte das estruturas de financiamento dos sindicatos, com todos
os defeitos que possam ter, sem transição, sem negociar, sem conversar. O
trabalho intermitente virou uma peste no Brasil, que nos retorna ao séc XIX.
Agora, enfrentar o abuso da Justiça do Trabalho, isso é uma coisa que estou de
acordo. Meu compromisso é convocar um debate nos seis primeiros meses de
governo. A reforma tem e proteger o lado mais fraco na relação capital x
trabalho, que é o trabalho. É claro que a grande virtude é a livre negociação,
mas num país de 3,7 milhões de desempregados, 32,2 milhões de pessoas
empurradas para viver de bico, como é que você vai fazer uma negociação com a
calça da classe trabalhadora arriada, fragilizada? Que o capitalista brasileiro
aprenda que o capitalismo moderno se afirma no consumo de massa, e o consumo de
massa só se pratica com renda. Não vai ter comércio, indústria pujante se a
régua do povo está definhando como está.
O senhor também disse que ia encontrar uma fórmula para limpar o nome
das pessoas no SPC...
Já encontrei. Estou com tudo planejado
e escrito, mas estou numa disputa política. Vou mostrar como é que faz. O valor
nominal desse conjunto de dívidas está absolutamente inflado com juros,
correção monetária, juros sobre juros, multa etc. Quando você vai para um
leilão do Serasa, está alcançando 80% de deságio. Imagina se o governo pega os
grandes portadores dessa dívida, chama todo mundo e diz: ‘olha, o governo vai
securitizar essas dívidas’. O débito médio é de 1400 reais. Aí eu empresto, com
um certo prazo de carência, quito, limpo o nome do cara no SPC, e o cara passa
a dever ao Banco do Brasil. Vou lançar o refis dos pobres. O refis dos
empresários, o Bolsonaro vota a favor, o Alckmin vota a favor, mas para o povão
é impossível, é difícil, não dá. Na prática, vou ajudar a financiar, em prazo e
juros suportáveis, a dívida descontada para o brasileiro. Não é porque sou
bonzinho. É porque um dos motores mais importantes da ativação da economia é o
consumo das famílias.
O senhor acredita pode derrotar Bolsonaro num 2º turno?
Chegando ao 2º turno, acho que ganho a
eleição, mais porque o Brasil está procurando a mudança responsável,
equilibrada, sem extremismo, e tocada por quem sabe o que está falando. O Bolsonaro
representa o protesto, a negação da política convencional, apesar de ele ser
deputado federal há 28 anos. Mas quando ele adota uma política econômica
ultraliberal, ele mata a condição do Brasil.
Fonte: Jornal do Brasil