Após mais de sete anos ocupando o cargo de vice-governadora do Ceará, Izolda Cela (PDT) deve assumir o mais alto posto do Executivo estadual a partir de março deste ano. Mesmo com ela e o governador Camilo Santana (PT) sendo cautelosos sobre a decisão, parlamentares e interlocutores do Governo já dão como certa a chegada da pedetista ao cargo.
Izolda,
no entanto, terá pela frente uma série de desafios diante
de um ano eleitoral, em que ela própria é cotada como candidata, e chega com a
missão de manter coesa uma ampla base construída
ao longo de 15 anos de atuação de um mesmo grupo político no governo.
Na
última sexta-feira (18), durante a inauguração de uma escola de tempo integral,
no bairro Vicente Pinzón, em Fortaleza, o governador ressaltou a confiança nas
habilidades políticas de sua vice. “Ela (Izolda) terá até mais habilidade do que eu (para
lidar com a base)”, disse.
Camilo
chegou ao segundo mandato com um arco de aliança somando 24 partidos, com
siglas da direita à esquerda. Agora, ao se aproximar do período de
desincompatibilização para concorrer ao Senado Federal, vê siglas como PP, PL,
PSD e MDB, até então da base, ameaçando lançar candidatura própria ou até mesmo
reforçar a oposição.
Também
na sexta-feira, Izolda reforçou os planos do atual chefe do Executivo.
E
fez um aceno à base: “Acho muito importante essa amplitude da aliança daqueles
que estão comprometidos com o projeto que faz o Ceará crescer e se desenvolver,
tenho compromisso com isso também”, ressaltou.
AS ALIANÇAS
Além
das especulações sobre assumir o Governo ainda neste ano, Izolda está na lista
dos quatro nomes cotados pelo PDT para encabeçar uma chapa de sucessão ao
Governo do Ceará. Além dela, completam as opções: o ex-prefeito Roberto
Cláudio, o presidente da Assembleia Legislativa, Evandro Leitão, e o deputado
federal Mauro Filho.
Caso
assuma o Governo e seja escolhida pela sigla para liderar a chapa eleitoral,
Izolda enfrentará, na verdade, uma disputa pela reeleição neste ano. Essa
possibilidade agrada alguns partidos governistas, que vêem neste cenário a
possibilidade de fazer a “fila da sucessão andar” mais rapidamente.
No
entanto, conforme a cientista política Monalisa Torres,
professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), a
conjuntura política encontrada pela pedetista atualmente é mais delicada do que
a enfrentada por Camilo Santana em 2018.
DE OLHO NO EXECUTIVO
Entre
esses atores políticos, alguns já colocaram o nome à disposição. Ex-secretário
das Cidades e atual deputado estadual, Zezinho Albuquerque (PDT)
é um deles. O parlamentar, que pode deixar o atual partido para filiar-se ao
PP, presidido por seu filho, o deputado federal AJ Albuquerque, disse ter
interesse em liderar uma chapa pelo Governo do Estado.
Outro
aliado de Camilo Santana que colocou o nome à disposição foi Eunício Oliveira (MDB). Correligionários de
Camilo, Luizianne Lins (PT) e José Airton Cirilo (PT) também travam uma queda de
braço com o mandatário para lançar uma chapa liderada por um dos dois. O
ex-vice-governador Domingos Filho (PSD)
também tem reforçado o desejo de disputar o Governo do Estado.
“A
dinâmica político-partidária no Ceará tem a característica de articular grandes
coalizões partidárias, só que essas grandes coalizões têm um limite, porque são
muitos partidos e legendas muito heterogêneas, com lideranças que têm
interesses particulares e, muitas vezes, divergentes”, afirma Torres.
UM DESAFIO PARA IZOLDA
“É
aí que está o desafio dela: dar continuidade e encerrar o legado ‘camilista’,
entregando o que foi prometido, ao mesmo tempo em que tenta amenizar as tensões
na base diante de inúmeras pressões de atores políticos que ganharam força nas
eleições de 2020 e, agora, vão sentar-se à mesa de negociações para montar a
chapa majoritária (...) São cálculos importantes a serem considerados pelo PDT,
e Izolda será a comandante disso à frente do Governo”, ressalta a cientista
política.
Na
avaliação do ex-vice-governador Domingos Filho, a transição para o fim do
mandato camilista não deve ser turbulento, mas sim “harmônico”. “A Izolda já
vem contribuindo com o modelo de gestão e governança desde quando era secretária
e vem mantendo isso como vice-governadora. Na prática, não teremos alteração de
conteúdo”, afirma o líder partidário.
Para
ele, que também já se viu diante da possibilidade de assumir o Executivo
estadual – o que acabou não ocorrendo, já que Cid Gomes (PDT)
cumpriu o mandato até o fim – a atual vice-governadora adotará uma linha de
continuidade, o que facilitará a gestão e as articulações políticas com o arco
de aliados.
GOVERNO CAMILO E IZOLDA
Na
última terça-feira (15), durante visita às obras do Hospital Universitário do
Ceará, no campus do Itaperi, da Uece, o governador ressaltou essa proximidade
que tem com a vice-governadora.
“Nós
conversamos há sete anos. Eu sempre coloco que o governo é o governo do Camilo
e da Izolda. Nós estamos juntos há sete anos para honrarmos nosso compromisso
que apresentamos à população cearense”, disse.
“É
a vice dos sonhos de qualquer governador. É uma pessoa extraordinária, uma
mulher de fibra, inteligente e sensível. É uma referência hoje, não só no
Ceará. É uma mulher que deu grande contribuição para a educação, para a
revolução que o Estado tem feito pela educação", acrescentou.
CONTRA O RELÓGIO
Durante
a visita à obra do hospital universitário, Camilo lançou mais um desafio para o
fim do mandato, que deve acabar recaindo para o “Governo Izolda”. Ele listou
uma série de obras a serem inauguradas ainda em 2022 com status de prioridade.
A própria unidade de saúde é uma das metas. Com 42% das obras concluídas, os
planos do mandatário são de que, até o fim do ano, a construção seja
finalizada.
Outra
prioridade apontada por Camilo foi a "Estação das Artes Belchior" –
um complexo criativo, turístico e de entretenimento no Centro da Capital. A
lista segue com o Polo Gastronômico da Sabiaguaba e o Parque Aloísio
Lorscheider, no Itaperi. Na segurança, a meta é entregar o Centro Integrado de
Segurança Pública, no Bairro de Fátima, ainda neste primeiro semestre de 2022.
Conforme
explicou o governador, tanto o andamento de obras quanto as inaugurações foram
afetadas por conta da pandemia, mas devem ser concluídas ainda neste ano, o que
coloca sobre a futura governadora a pressão pela entrega dos equipamentos, que
também devem servir de vitrine para a campanha da chapa governista.
O PESO DA POPULARIDADE DE CAMILO
Para
a cientista política e professora universitária Carla
Michele Quaresma, outro fator que pressionará a futura ocupante do
Palácio da Abolição será a popularidade do atual mandatário.
“O
governador deixa o segundo mandato com um índice de popularidade alto, mesmo
tendo enfrentado uma crise sanitária e não tendo conseguido solucionar um
problema histórico, herança de sucessivos governos, que é a questão da
segurança pública, apesar dos altos investimentos que ele fez”, pondera.
Para
ela, a tendência é de que a oposição intensifique os ataques tanto contra
Camilo – caso dispute vaga no Senado – quanto contra Izolda – caso dispute o
Governo –, e a segurança pública deve ser o principal tema dos embates.
SEGURANÇA PÚBLICA
“Talvez
o grande desafio dela diante da candidatura dele seja manter essa imagem que
ele conseguiu construir. Em segundo plano, ela sendo candidata, o desafio será
mostrar os avanços no Ceará, principalmente nessas questões mais
sensíveis, como a segurança pública”, afirma.
Quaresma
ressalta ainda que a vice-governadora enxerga a segurança pública sob um viés
mais social, o que pode ser pouco compreendido durante a campanha.
“É
um viés de que investimentos no social, em saúde e na implementação de uma
cultura de paz é que vão construir um Estado mais seguro, mas isso leva tempo,
são políticas de longo prazo, e a sociedade quer resultados mais imediatos”,
pontua.
SAÍDA PELO DIÁLOGO
Diante
dos desafios de um eventual Governo Izolda, as cientistas políticas Carla
Michele Quaresma e Monalisa Torres apontam que o enfrentamento desse cenário
deve ser feito com diálogo.
“Tanto
ela quanto Camilo foram escolhidos com a ideia de construir um governo técnico,
então ela tem suas qualidades neste sentido. Em relação a essa habilidade de
coordenar interesses políticos divergentes enquanto coordena o governo, ela vai
ser testada agora”, acrescenta Torres.
“O Camilo tem o perfil de apaziguador, sereno, aberto ao diálogo, a Izolda não me parece ser diferente. Teremos essa resposta em breve, mas ela demonstra ter interesse em estar atenta à forma como o governo funciona, como foi gerido e dar continuidade”, conclui Monalisa Torres.
(Diário do Nordeste)