No curto período de 72 horas,
Bolsonaro deu-se ao luxo de protagonizar dois episódios desastrosos para sua
imagem. O primeiro aconteceu no último domingo.
Um vídeo de menos de um
minuto, postado nas redes sociais mal acabara de ser rodado, mostra Bolsonaro
sentado numa cadeira à beira de uma calçada, em Brasília, a empanturrar-se de
frango e farofa comidos com as mãos. A ideia era apresentar o presidente da
República como um autêntico “homem do povo”, mas acabou servindo para
popularizar a hashtag #BolsonaroPorco.
Quem
disse que o brasileiro pobre aprecia comer com as mãos e em locais públicos? Só
o faz quando não tem talheres, nem espaço adequado, nem tempo para
alimentar-se. A comida é tão racionada que ele evita o desperdício. Enquanto
arrancava nacos de carne dos ossos do frango com os dentes, a farofa escorria
pelo corpo de Bolsonaro, sujando seu casaco, suas calças e botas. O pior,
porém, foi quando começou a circular outro vídeo que registrou os bastidores do
primeiro.
Sob
o comando do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), o filho Zero Dois do
presidente, uma equipe de cinegrafistas e de assessores cuidava para que tudo
desse certo, enquanto Bolsonaro procedia com a naturalidade exigida de um bom
ator. Ele foi filmado de vários ângulos, ora em uma mesa próxima do balcão de
comidas, ora em outra separada. A peça de propaganda saiu barata. Os que se
envolveram com ela são pagos com dinheiro público.
Corta! Menos de 48 horas depois. Bolsonaro está em São Paulo. Foi sobrevoar municípios atingidos por fortes chuvas. Em dezembro último, preferiu tirar férias e passear de jet sky a sobrevoar municípios baianos e mineiros onde as chuvas matavam e desabrigavam milhares de pessoas. Pegou muito mal para ele que não quis incorrer no mesmo erro desta vez – escolheu outro, como se saberá adiante. De resto, São Paulo é o maior colégio eleitoral do país, que em 2018 lhe deu 60% dos seus votos no segundo turno. Hoje, ali, segundo pesquisas, ele está atrás de Lula.
Encerrado o sobrevoo,
Bolsonaro concedeu uma entrevista coletiva à imprensa, prometeu recursos aos
prefeitos que lhe pedirem diretamente, negou um pedido de recursos encaminhado
pelo governador João Doria (PSDB), seu desafeto, e… Bolsonaro não seria o que é
se não tivesse dito alguma coisa que o prejudicasse. Disse que “faltou visão de
futuro” às pessoas que construíram suas casas em áreas de risco, sujeitas a
deslizamentos de encostas. Em seguida, tentou corrigir-se: “Muitas vezes
constroem a sua residência por necessidade”. Mas era tarde. O estrago estava
feito.
Quem,
podendo construir sua casa em lugar seguro, escolhe construí-la onde ela pode
desabar se chover muito? Por que cidades de grande e médio porte estão repletas
de favelas onde moram milhões de pessoas e onde a presença do Estado é
praticamente nenhuma? Rico ou remediado não mora em favela, quem mora é pobre,
que não pode ser culpado por suas desgraças. A malsucedida viagem de Bolsonaro a
São Paulo foi também pretexto para que ele fugisse da sessão de reabertura do
Supremo Tribunal Federal, onde responde a vários processos.